Úrsula – um romance identificado com o movimento artístico romantismo – traz um diferencial em relação a outras obras: a presença do discurso daqueles pertencentes à camada mais desfavorecida da sociedade da época: os escravizados. Discurso esse que demonstra a ciência dessas personagens sobre as suas condições duras e injustas de vida e, também, sobre as suas origens africanas.
Nessa obra, Maria Firmina denuncia a escravidão. Úrsula é entendido como o primeiro romance abolicionista escrito por uma brasileira. Mas o que sabemos sobre sua autora?
Creio que, ainda, muito pouco. Sua biografia – ainda que recheada de lacunas – nos permite inferir ser uma mulher inteligente, culta, atenta às questões políticas e sociais de seu tempo. Professora, ela fundou, em 1880, uma escola mista e gratuita. Esse feito, que hoje não causa estranheza, foi um acontecimento fora dos padrões da época e, por muitos, entendido como um abuso contra os bons costumes.
MARIA FIRMINA DOS REIS
Musicista, professora e escritora, as fontes que temos indicam que frequentava os espaços intelectuais de sua época. Entre essas fontes, há registros de publicações suas – poesias, charadas, crônicas – em jornais da época. Sua produção e presença nos redutos da intelectualidade maranhense não legaram a ela reconhecimento nacional enquanto viva. Somente nos meados do século XX (anos 1960), a autora de Úrsula foi reconhecida e alçada à categoria de grande escritora brasileira.
Maria Firmina, segundo algumas fontes, era filha de uma liberta. De acordo com outras, era filha de uma mulher branca com um homem negro. Alguns artigos informam que, no seu registro de nascimento, consta a paternidade como ilegítima. Nasceu em São Luís no ano de 1822. Órfã aos cinco anos de idade, foi criada por uma tia (irmã de sua mãe) na vila de São José dos Guimarães. Faleceu em 1917, aos noventa e dois anos.
Úrsula é considerado o primeiro romance de autoria feminina publicado no Brasil [1]. Muitos leitores o criticam como leve diante dos horrores da escravidão. Talvez, a escritora temesse que o uso de um tom mais duro em sua narrativa comprometesse a publicação da obra (1859). Uma pista que nos leva a esta suspeita é seu conto intitulado “A Escrava”, publicado no ano de 1887. O referido conto apresenta uma denúncia mais pesada, mas o contexto da luta abolicionista é, também, mais amplo: está presente em todo o Brasil e encontra adeptos em todas as camadas sociais.
ANÚNCIO de venda do romance ÚRSULA.
“Uma Maranhense” era o pseudônimo da autora (Maria Firmina dos Reis)
Úrsula, em homenagem a Maria Firmina Firmina dos Reis, é o nome da seção de Histori-se onde encontramos textos (poemas, poesias, crônicas e outros) escritos por nossas colaboradoras.
NOTAS
[1] – Úrsula ser o primeiro romance publicado por uma mulher no Brasil é uma informação questionada. Muitos atribuem o título de primeira romancista a Nísia Floresta Brasileira Augusta; entretanto, a obra Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens, primeira publicação de Nísia Floresta, é identificada como uma tradução livre. Outros atribuem esse título a Teresa Margarida da Silva e Orta, que viveu no Brasil somente até os seus seis anos de idade. Sua obra – Aventuras de Diófanes – datada de 1752, foi publicada em Portugal. Teresa é considerada a primeira romancista do império português.
[2] – No ano de 1962, o historiador Horácio de Almeida (1896 – 1983) descobriu um exemplar do romance Ùrsula em um sebo (loja de livros usados) localizado no Rio de Janeiro/RJ. Algum tempo depois, em 1975, publicou uma edição fac-similar (patrocinada pelo governo do Maranhão). Ainda em 1975, José Nascimento Morais Filho publicou uma pesquisa sobre a autora de Úrsula: Maria Firmina: Fragmentos de uma Vida.
[3] – A imagem de Maria Firmina publicada como destaque desta postagem está presente na Revista Negócios O Globo e BBC NEWS ( edição de 25/07/2020).