Pela Vida de Meninas e Mulheres
#pela vida de meninas e mulheres
Começo afirmando: “este texto não é defesa do aborto. No Brasil, o aborto é crime. Este texto é denúncia contra a violência legislativa”.
O aborto no Brasil já é crime, exceto em três situações:
- em casos de estupro,
- risco de morte para a gestante e
- anencefalia fetal.
A Câmara dos Deputados aprovou, em apenas 24 segundos, o Projeto de Lei (PL) 1904/2024, que equipara o aborto legal, após 22 semanas, ao crime de homicídio.
Um tema tão sério e complexo como o aborto em um PL, que pode alterar o Código Penal brasileiro, foi privado de maior análise pelas comissões temáticas da Câmara antes de seguir para o Plenário.
O texto do PL demonstra ausência de empatia para com as mulheres brasileiras em suas diversidades; além de profunda ignorância acerca das realidades sociais brasileiras.
Um projeto pró-morte.
A urgência para a votação desse projeto esconde um jogo de interesses e medição de forças nas disputas políticas e de interesses entre parte dos parlamentares e o governo.
Isso sem esquecer a rusga com o Ministro Alexandre de Moraes (STF), em especial, a partir da decisão liminar favorável ao PSOL em relação à assistolia fetal ou ainda, retaliação à posição da Ministra Rosa Weber (STF), favorável à descriminalização do aborto em todos os casos até a 12ª semana de gestação.
A vida de mulheres e meninas? Desconsiderada.
O que somos nas cartas do jogo do poder?
Atualmente, a pena prevista para mulheres que abortam é de detenção de um a três anos, exceto para as que estão enquadradas nos seguintes (e já citados) grupos: em casos de estupro, risco de morte para a gestante e anencefalia fetal.
O PL 1904/24 prevê crime, também, para as vítimas de estupro com penas equivalentes à prevista para homicídio simples: reclusão de 6 a 20 anos.
Onde estão as medidas previstas para o acesso rápido, seguro, gratuito e digno à possibilidade do aborto para as mulheres vítimas de estupro ou que estejam contempladas pelos outros casos previstos na lei?
A preocupação dos parlamentares com as mulheres e, em especial, com as meninas vítimas de violência sexual que engravidam? Com as condições e o tempo para denunciarem os abusos? Com o acesso dessas mulheres ao atendimento médico e psicológico digno?
Sabia que grande parte das grávidas fruto de estupros são crianças, violentadas no seu lar ou espaços de confiança? Muitas com idade inferior a 11 anos?
Dos mesmos que condenam a educação sexual nas escolas, agora temos: penas para meninas e mulheres mais duras que para aqueles as violentaram. Misóginos.
Aborto é questão de saúde pública.
É mais fácil desrespeitar a condição laica do Estado brasileiro do que estudar a sua realidade.
No Brasil, o aborto é crime.
A questão aqui não é se eu ou você somos contra ou a favor do aborto.
Também não é se somos contra ou a favor da criminalização do aborto, como já está na Lei.
A questão aqui é de violência legislativa e de violência parlamentar.
Notas:
- A Câmara dos Deputados do Brasil aprovou a tramitação do Projeto de Lei (PL) 1904/2024 em regime de urgência no dia 12 de junho de 2024.
- Caso seja aprovado pelo Plenário da Câmara dos Deputados, o PL seguirá para apreciação do Senado.
- O Conselho da OAB divulgou no dia 17 de junho Parecer sobre o PL 1904/24. Cito trecho: ” Absoluta desproporcionalidade e falta de razoabilidade da proposição legislativa em questão, além de perversas misoginia e racismo. Em suma, sob ótica do direito constitucional e do direito internacional dos direitos humanos o PL 1904/2024 é flagrantemente inconstitucional, inconvencional e ilegal”.