HISTORIETA EXPLICA
Por muito tempo, embora constante, a reação à escravidão no Brasil não foi suficiente para abalar essa odienta instituição.
Eram revoltas de pessoas escravizadas colocadas em efeito em ações sutis nos seus cotidianos, revoltas de pequenos grupos de escravizados restritas às suas localidades (fazendas, vilas ou cidades), fugas, formação de quilombos.
A reação era constante (e arriscada) contra ser escravizado, mas sem forças ou objetivos para atingir a instituição escravidão.
Em relação à população que vivia no Brasil, era pequeno o número de pessoas livres que poderíamos identificar como atuantes no combate à escravidão.
A maioria das pessoas, mesmo as que não tinham escravos aos seus serviços, de uma forma ou de outra, dependia – economicamente – do trabalho escravo.
O processo de abolição da escravidão no Brasil foi longo e muito complexo.
Falo somente sobre uma pequena porção de um quebra-cabeça de difícil montagem.
Que, nos anos de 1880, havia gente propondo que a escravidão existisse no Brasil até o ano de 1930?
Para você ter uma ideia de tempo, lembre que, em 1930, teve início o período conhecido como Era Vargas no Brasil.
Você sabe a origem da frase “para inglês ver”?
Para reconhecer a Independência do Brasil (1822), a Inglaterra exigiu o fim do tráfico de pessoas escravizadas para o Brasil. Tratado assinado (1826) e não cumprido.
Milhares de africanos continuaram desembargando forçadamente no litoral brasileiro, principalmente a partir de 1837, quando a cafeicultura está em grande desenvolvimento no país.
Portanto, o “Tratado de 1826” – prevendo o fim do comércio internacional de escravos – assinado com a Inglaterra, na prática, não foi cumprido.
ABOLICIONISTAS A PARTIR DE 1879?
Lógico que existiam pessoas livres que condenavam a escravidão e a desejam extinta antes de 1879.
Um exemplo foi Maria Firmina dos Reis, autora do romance Úrsula, que nomeia a seção de Histori-se dedicada às produções de mulheres contemporâneas que escrevem.
Podemos perceber, em especial através da localização e de modos de sobrevivência de quilombos, relações entre pessoas livres e quilombolas sejam econômicas, sejam de “rede de apoio” (ou ambas).
O cotidiano sempre foi mais complexo do que as teorias que de longe tentam explicá-lo.
Em geral, situa-se o movimento abolicionista a partir de 1879; entretanto, desde anos anteriores a 1850, quando foi assinada a Lei Eusébio de Queirós, encontramos evidências da atuação de associações em prol do fim da escravidão.
A Lei Eusébio de Queirós proibiu o tráfico ultramarino de pessoas escravizadas.
A partir de 1860, podemos observar documentos que demonstram a existência de diversas manifestações e ações visando coibir a escravidão.
Essas ações, operando em uma complexa teia de interesses diversos, foram fundamentais para a aprovação da Lei do Ventre Livre.
Uma Lei que teve o efeito, na visão de várias analistas, de retardar a abolição.
Nesse sentido, ao percorremos documentos da época encontramos – por parte de pessoas favoráveis ao fim do trabalho escravo – críticas à sua aprovação e/ou ao alcance.
Foi na década de 1860 que aconteceu uma expansão do movimento abolicionista, com ações sociais e públicas e criação de diversas associações pró abolição em diferentes locais do Brasil.
Inclusive, surgiram associações mistas (com associados de ambos os sexos) e femininas.
Muitas e diversas foram as mulheres que se engajaram na causa abolicionista.
Alice Clapp, cuja história foi contada para Histori-se pela Miriam Zanutti
{ Alice Clapp } é um exemplo de mulher intelectual com grande protagonismo na causa abolicionista.
A busca pela abolição encampou diferentes setores da sociedade da época e, podemos dizer, abrigou, também, diferentes interesses.
Motivou muitos conflitos, muitos com a presença de grande violência.
A expansão do movimento abolicionista, assim como a sua pluralidade, teve como uma de suas ações a busca pela atuação na seara da política com ação representantes para a defesa da causa nas instituições.
Esse recurso foi muito presente entre os anos de 1879 e 1885.
A partir do ano de 1885, com um parlamento de maioria conservadora, os movimentos de combate à escravidão, assim como as reações de escravizados, foram alvos de maior repressão.
Se a repressão foi mais forte, mais ousada foi, também, a ação de setores do movimento abolicionista e a reação de escravizados.
Que, entre os abolicionistas, havia vários grupos com modos de agir também diferenciados.
Podemos dizer que encontramos desde grupos muito moderados em suas ações até grupos que caracterizaram por ações consideradas muito radicais.
Que a adesão pública da Igreja Católica à causa abolicionista só aconteceu em 1887?
13 de maio de 1888: Lei Áurea.
E o dia 14?
Esta pergunta não tem a intenção de esvaziar a importância do movimento abolicionista, da luta de escravizados pela mudança de seu status ou, ainda, não reconhece a importância de estar extinta de forma legal a escravidão no Brasil.
A intenção ao questionar sobre o dia 14 é lembrar que, para aquelas pessoas que estavam na condição de escravizados ou recém – libertos ou aquilombados no raiar do dia 13, a Lei Áurea foi essencial, mas incompleta.
Incompleta, pois não veio acompanhada de políticas públicas de integração de quem esteve preso aos grilhões da escravidão à sociedade livre.
Digo de formação profissional, educação e saúde básica, possibilidade de acesso a terras para estabelecerem-se como pequenos agricultores, entre outras possíveis ações.
Um exemplo?
Mesmo as políticas de povoamento do território nacional que buscaram imigrantes para tal empreitada, como – por exemplo – na região da serra gaúcha, não ofertaram essa possibilidade aos descendentes de escravizados.
NÃO HÁ MAIS ESCRAVIDÃO?
Gostaria de afirmar que não há mais escravidão.
A realidade não deixa, o noticiário lembra.
A Lei Áurea tornou ilegal a escravidão.
Mas a pobreza e a falta de instrução facilitam a aceitação por trabalhadores de outras formas de relações de trabalho que mascaram um meio de escravidão.
Ainda é frequente, denúncias e descobertas de trabalhadores vivendo em condições degradantes, consideradas análogas à escravidão.
Que, desde o ano de 1940, o Código Penal Brasileiro prevê a punição para quem explora o trabalho escravo contemporâneo, também identificado como “em condições análogas à escravidão”.
- Maria Firmina dos Reis – madrinha da seção mulheres que escrevem de Histori-se . Leia < https://historise.com.br/o-romance-ursula-e-histori-se/ >.