A imagem contém o texto Memórias de uma professora
Arte: Histori-se. Imagens originais disponíveis no Canva.
Memórias de uma professora de Educação Básica.
Úrsula
Mulheres que escrevem

A descoberta do poder do era uma vez
(memórias de uma professora)

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O CONTO MARIA FLOR

O conto Maria Flor é um exemplo dos diversos textos que produzi ao longo de minha carreira docente com objetivo de instigar a curiosidade pelos conhecimentos históricos, assim como pela pesquisa – ou ainda – para o entendimento ou a construção de conceitos ou como ferramenta para trabalhar temas sensíveis ou polêmicos em determinadas épocas.

Cativar o Outro pela narrativa de uma história ou causo, chamar a sua atenção e, pelo lúdico, aproveitar o seu espírito distraído para instigar a sua curiosidade.

Histórias como sedução para o conhecimento histórico, como janelas para a compreensão de processos históricos e suas permanências (ou não) na nossa realidade atual.
Eis a minha teia de sedução!
Era uma vez…”

Eu lembro a primeira vez que experimentei essa arte – usando o linguajar de estudantes de uma determinada época – ‘seduzente’.
Na época, eu nunca classificaria de arte, mas de insight.

Querem saber? Conto um pouco.

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 A DESCOBERTA

Lá estava eu – calça jeans, camisa tipo bata de algodão, rabo de cavalo e 22 anos no final dos anos de 1980 – olhando a turma que prestava pouca atenção à professora: 36 estudantes na faixa dos 12 anos empolgados após um agitado recreio.

A empolgação nada tinha a ver comigo ou com a aula que ministraria… Isso é importante dizer.
O assunto não ajudaria muito… “abdicação de Dom Pedro e o período regencial”.

De repente, ouvi o grito e suas reverberações: “- olha a professora!”
Como uma onda, o “olha a professora” provocava eco e corpos se ajeitando nas carteiras em meio a zumbidos… “A professora!”.

Era ali … Naquela brecha de tempo de breve silêncio, onde eu teria a minha chance (ou nunca mais nos próximos 30 minutos).
Foi então que me ocorreu a figura de meu pai que contava histórias e causos e eu disse:

“Era uma vez. Vocês querem saber? Era uma vez, no tempo que nenhum de seus avós existiam”.

Ali, em um dos meus primeiros momentos enquanto professora, na segunda semana de experiência enquanto docente: eu descobri o poder do “Era uma vez”.

Ali, eu iniciei – meio desajeitada – o primeiro ponto de minha teia de sedução:
o contar histórias (reais ou fictícias, escritas por mim ou por outras pessoas ou – ainda – parte da cultura popular).
Pílulas para ocasiões especiais.

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1994

Era o ano de 1994 e lá estava o livro didático com a clássica imagem de um homem escravizado sofrendo castigo.
O tema da aula: abolição da escravatura. Olhares difusos pela sala… eu podia sentir o incômodo silenciado de parte do alunado.
Não sei explicar, ninguém tinha aberto o livro, além de mim…, mas eu já sentia.

Aqueles corpos falavam o que me incomodou quando observei o texto no manual didático ao preparar a aula?
Não! Diziam muito mais do que eu poderia alcançar.

Ao preparar aula, veio em minha memória: a menina de dez anos de idade ouvindo seu pai questionar as figuras existentes no seu material escolar para tarefa sobre o mesmo tema.

Não era o meu pai que estava equivocado, nem as conclusões da menina de dez anos, nem o mal-estar da professora e muito menos os olhares e corpos de parte dos estudantes.
Era o discurso presente no manual didático.

Como resolver a aula?
“Era uma vez, num tempo muito antes de seus avós nascerem, um rapaz de nome Luís que era um rábula. Vocês sabem o que é um rábula? […}”.

Retrato de Luís Gama

O texto inicial da apostila que confeccionei para ministrar o referido conteúdo, quando mimeografado, além do tradicional cheirinho de álcool, trazia a imagem de Luís Gama.

Compartilhei com vocês duas de minhas experiências instigadoras do escrever e do contar histórias estruturadas sobre o conhecimento histórico.
Há muitas ao longo de minha carreira docente, mas escolhi essas pertencentes aos primeiros anos de atuação no magistério.

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As origens do livro Maria Flor

Maria Flor é um texto recente fruto de minha experiência docente e de minhas pesquisas enquanto historiadora e psicopedagoga.

A historiografia e a literatura em suas convergências são linhas de minha teia sobre a qual a personagem Maria Flor narra suas origens, histórias de sua comunidade e infere os desafios que a aguardam.

O mote para a escrita deste conto foi a demanda de um projeto cultural voltado para mulheres com o qual fui convidada a colaborar.
Sua escrita resgata a liderança feminina e relações ancestrais.
Suas personagens – embora fictícias – são mulheres que conheço em meu coração.

Bonecas feitas em tecido. Artesão Júlio. Marca: Feito com amor.

O texto < Simplícia e Maria Flor> publicado primeiro no site da revista Histori-se ganhou versão ilustrada e impressa em novembro de 2022.

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Notas:

  1. Texto mimeografado = texto reproduzido (cópias) através do mimeógrafo, instrumento muito comum nas escolas brasileiras até meados da década de 1990. Confira o vídeo para você entender como funcionava: < Marlete ST demonstra a utilização do mimeógrafo.>.
  2. O livro Simplícia e Maria Flor conta com ilustrações de Vanessa Martinelli Lewandowski e capa e diagramação de Márcio Schalisnki (LC Design & Editorial).
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