Imagem de Giorgio Giannone in Pixabay, 2022
Breve reflexão sobre Inclusão escolar e alguns apontamentos para a pesquisa sobre ensino-aprendizagem com estudantes com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Educação & pesquisa

FACES POUCO VISITADAS DE PROJETOS DE PESQUISA COM ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NO AMBIENTE ESCOLAR

Uma  Primeira Conversa

I. A motivação para esta conversa

Iniciarei esta breve palestra com uma pergunta. Você sabia que entre 21 e 27 de março, em diversos países, é comemorada a Semana de Celebração da Neurodiversidade?

Você sabia que o mês de abril é o Mês da Conscientização do Autismo e que o Dia Mundial da Conscientização do Autismo é o 2 de abril?

Nesta semana, tive, novamente, a oportunidade de prestar uma consultoria sobre pesquisa com estudantes e inclusão escolar. Ao longo da reunião com a pesquisadora e a professora orientadora, assim como nos momentos de leitura das primeiras anotações, percebi que, ainda, é comum alguns detalhes passarem sem interrogações em investigações nessa amplitude temática.

Resolvi  trazer, neste pequeno espaço, uma primeira conversa que creio poder auxiliar não, apenas, pesquisadoras (res), mas todas as pessoas que pensam o universo escolar e a inclusão, assim como o processo de ensino-aprendizagem, seja para grandes investigações seja para a elaboração de suas estratégias de aula e /ou gestão escolar.

Devido às datas e ao tema da pesquisa mencionada, darei enfoque a estudos de casos com estudantes com TEA (Transtorno do Espectro Autista).

Cartaz da Revista Autismo

PENSAR INCLUSÃO ESCOLAR

ESCOLA DE EXCELÊNCIA  &  INCLUSÃO

São diversas as interrogações e as condicionantes que permeiam as trajetórias de educandários em busca da possibilidade de se dizerem e – de fato – se entenderem como inclusivos.

Uma escola “de todos e para todos” cabe nos critérios de admissão e de permanência institucionais?
  • Na organização seriada?
  • Nos domínios das disciplinas tradicionalmente – e historicamente – constituídas?
  • Nas avaliações tradicionais?
  • Nas formas como adestramos os corpos e cadenciamos os sentidos, silêncios, falas?
 Um ensino entendido como de excelência e uma escola adjetivada como de excelência são compatíveis com princípios básicos da humanidade como respeito às particularidades, cooperação, fraternidade?
  • Que educação de excelência desejamos?
  • O que é escola de excelência?
  • Que formação básica os professores e demais trabalhadores da educação devem receber?

Uma certeza é que aceitar estudantes com deficiências e/ou necessidades educacionais especiais na escola regular não é o bastante para se dizer inclusivo.

Na verdade, penso que responder as interrogações – Por que não aceitamos antes? Por que devemos aceitar agora? – são, apenas, as primeiras questões de uma série de reflexões que devem acompanhar o processo de busca da condição de escola inclusiva.

Pensar em inclusão escolar é descortinar uma paisagem diferenciada e pontuada por tensões e interrogações cuja coerência é gerada a partir do princípio da diferença.

É conceber o mundo a partir do conceito da diferença, em um exercício de buscar substituir o temor e a insegurança – que seu ecoar possa nos trazer – pelo desafio de se instigar a investigar, a acolher, a ousar novas maneiras de olhar e de perceber.

Pensar inclusão escolar é abrir espaço para refletir sobre: nossa sociedade, políticas educacionais, formação e profissionalização docente, sistemas de ensino, entre outras categorias. Passa por entender que inclusão escolar, assim como permanência na escola, é tema antigo nos debates que acontecem na seara da Educação Básica no Brasil.

A inclusão não é sobre matricular as crianças nas escolas regulares.

É sobre “mudar as escolas para torná-las mais responsivas às necessidades de todas as crianças (MITTLER, 2003, p.16)”. Implica o desenvolvimento de atitude inclusiva: atitude que tem como foco “enxergar o Outro sem reduzi-lo às marcas de seu corpo; às mutilações que sofreu ou as ineficiências que seu organismo expõe quando comparado a outro (FREITAS, 2013, p.17)”.

Incluir não é sinônimo de inserir pessoas no ambiente escolar.

Permitir a frequência, sem maiores considerações, no máximo, irá reforçar a categoria dos “excluídos do interior” (BOURDIEU, 2003, p. 481).

Incluir diz sobre contribuir para a “pessoa ser capaz de ter oportunidades de escolha e de autodeterminação. Em educação, isso significa ouvir e valorizar o que a criança tem a dizer, independente de sua idade ou de rótulos (MITTLER, 2003, p. 17)”.

Imagem in Pixabay_2021.

APONTAMENTOS PRIMÁRIOS SOBRE INVESTIGAÇÕES COM ADOLESCENTES COM TEA NO AMBIENTE ESCOLAR

Um desafio nas investigações com crianças e adolescentes é o que idealizamos sobre o ser criança ou sobre o ser adolescente.

Creio que este desafio é intensificado quando – além das ideias que temos sobre o ser adolescente – contamos com as que temos sobre o que é ser uma pessoa com TEA. Como superar estes desafios?

Parte significativa deste processo está no esforço para “nos desvencilhar das imagens preconcebidas e abordar esse universo e essa realidade tentando entender o que há neles, e não o que esperamos que nos ofereçam (COHN, 2005, p. 8)”.

Como foi (ou está sendo) a participação discente no decorrer do processo investigativo?

Buscar a perspectiva do incluído exige recuperar saberes e reconhecer o alcance da análise de contexto que é empreendida por aqueles que esperam da escola umaatitude inclusiva’(FREITAS, 2013, p. 17)”.

Com certeza, a (o) pesquisadora tem construída a sua visão sobre o (a) estudante motivador (a) da pesquisa. Em geral, encontramos, nas pesquisas entrevistas (e não apenas), dizendo da pessoas com deficiência. Falam professores, pedagogos,  médicos, familiares, etc.

  • Quem é a (o) estudante na visão dos participantes citados?
  • Quem é a (o) estudante na visão da (o) pesquisadora? Esta visão muda ao longo do processo investigativo?

Muitas vezes, não encontramos nos estudos ou projetos o que, talvez seja o mais relevante, ou seja, o que a pessoa diz de si.

  • O que a (o) adolescente diz de si?
  • O que diz sobre a escola?
  • Sobre as disciplinas?
  • Sobre como aprende?
  • O que pensa e sente quem – ao ambicionar ser incluído – tornou-se – para a escola e para os professores – um exemplo de “aluno-problema”?

Bonequinho indicando dúvida

É MENINO ? É MENINA?

Por, incrível, que pareça, em nome de uma objetividade ou de uma proteção à identidade muitos estudos desconsideram a questão de gênero nos estudos de pessoas, no caso, estudantes com deficiência. Aqui, eu poderia discorrer longas linhas, contudo limitarei a lembrar que a questão de gênero, no caso das pessoas com TEA, começa influenciando já na possibilidade (ou não) de um diagnóstico.

Terminando esta breve conversa

Se a investigação é no ambiente escolar, lembre que toda instituição tem uma história, uma cultura, um discurso. Pesquise e reflita sobre o educandário que abriga o estudo.
Por último, não esqueça de estudar, com afinco, a documentação que versa sobre educação inclusiva e sobre direitos de pessoas com deficiência.

Este texto é despretensioso, traz, apenas, algumas pequenas reflexões sobre um universo temático imenso. Continuamos conversando.

marca Histori-se

Como citar este texto?

CARRA, Patrícia R. Augusto. Faces pouco visitadas de projetos de pesquisa com estudantes com deficiência no ambiente escolar: uma primeira conversa. In: Histori-se , Porto Alegre, v. 2, n. 1, março de 2022. ISSN 2763-8790, disponível on-line em < Inclusão escolar & pesquisa com estudantes >. Acesso em: acrescente a data do dia.

Notas:

  1. A Semana de Celebração da Neurodiversidade conscientiza sobre e celebra (desde 2018) as diferenças neurológicas da população, sobretudo as com deficiências.
  2. (BOURDIEU, 2003, p. 481) –  BOURDIEU, P. A Miséria do Mundo. Petrópolis: Vozes, 2003.
  3. (COHN, 2005, p. 8) – COHN, C. Antropologia da criança. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005..
  4. (FREITAS, 2013, p.17) – FREITAS, Marcos Cezar de. O Aluno Incluído na Educação Básica – avaliação e permanência. São Paulo: Cortez, 2013.  (Coleção Educação & Saúde: v.9)
  5. (MITTLER, 2003, p.16  e p.17) – MITTLER, Peter. Educação Inclusiva: contextos sociais. Tradução: Windyz Brazão Ferreira. Porto Alegre: Artmed, 2003.marca Histori-se
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