Imagem editada. Original de Dawnyell Reese in Pixabay _ 2021
Mulheres não nascem mães. Homens não nascem pais. Quando nasce um pai?
Cotidianos

PATERNAR

Penso na amorosidade, nos cuidados cotidianos, nos limites e nos encorajamentos. Penso no meu pai. Lembro o zelo de alguns amigos para com suas crianças. Digo do pai, dos meus filhos. Do meu cunhado. Dos meus dois irmãos.

Esses dias, olhando algumas fotografias, dessas tiradas sem pose, quase sem o conhecimento do fotografado, em algumas fotos, reparei nos rostos tomados pelo olhar apaixonado pelos seus bebês: eram fotografias dos papais da família.

Ontem, meu irmão postou uma fotografia dele e de minha afilhada no carro. Ele sorrisão. Ela feliz. A legenda: Hoje ela vai trabalhar com o papai.

MEU PAI

Minha infância teve a presença de um pai que ensinava sobre coisas da vida, que exigia e dava exemplo de respeito aos próximos, que contava histórias. Meu pai, por vezes, durão, tinha coração de passarinho e fazia artes de menino e, nós, a meninada seguia o arteiro mor.

Tenho muitas lembranças! Hoje compartilho uma delas. Meu pai levava a roupa suja da semana para uma senhora lavar. Era um pouco longe de casa. Nesse dia, durante a tarde, eu havia terminado um namoro. O namorado pedia para reatar. Quando meu pai pegou a trouxa de roupa, eu fui atrás. E lá ia a gente conversando ao longo do trajeto…

Uma hora, eu contei sobre o motivo do término e sobre a insistência do rapaz para o retorno. Ele ouviu com atenção. Conversando, com calma, alertou que o ciúme, com o qual o ex-namorado justificava as cobranças e as desconfianças, poderia ser o sinal do abusivo. Nenhum relacionamento poderia me deixar desconfortável, envergonhada ou com medo.

Eu tinha 15 anos e o que meu pai me lembrava, ele, desde que eu era bebê, vinha me ensinando. Não gastamos muito tempo de nossa conversa com o ex. Não era necessário. Mas esse foi um dos momentos em que muito falamos sobre o viver.

Eu confiava no meu pai. Quando íamos fazer piqueniques na beira de rios, ele entrava na água e marcava onde a gente podia nadar. Quando éramos pequeninos, ele usava suas técnicas pouco ortodoxas para nos ensinar a nadar e nós, simplesmente, confiávamos e nos divertíamos. Acho que ele aprendeu a ser pai sendo pai.

Eu, como era a filha mais velha, além de ser o seu primeiro experimento de ‘paternagem’, pude o ver aprendendo e se reinventando como pai, também, com meus irmãos e irmãs.

Quando ele partiu, eu tinha 26 anos. Pouco antes, numa de nossas conversas, sei lá por qual razão, ele me fez algumas recomendações (talvez previsse a possibilidade de partir tão jovem…). Em outras, foi me colocando a par de algumas coisas. Sei que quando precisei tomar algumas decisões, eu recordei essas conversas…

Ele partiu. Eu, muitas vezes, senti a sua presença. Acho que ele está com a gente e na gente. Não preso. Seu espírito é livre! Está no que nos ensinou. No que semeou em nossos espíritos.

PATERNIDADE: uma construção sócio-cultural

Pai, assim como mãe é uma construção sócio-cultural; contudo, o exercício da paternidade, assim como o da maternidade é uma experiência pessoal (lembrando que o pessoal não está desconecto do coletivo).

O dia dos pais no Brasil é uma data criada com fins de mercado na década de 1950 e, apenas, na década de 1970 ganhou relevância publicitária e comercial.

Deixando de lado sua raiz mercadológica, o Dia dos pais é, também, uma oportunidade para refletirmos sobre paternidades e, também, sobre maternidades. Entre os diversos caminhos e nuances, creio que não devemos confundir maternidades solos com paternidades.

Há muitas mulheres que criam os seus filhos e filhas sozinhas e que o fazem muito bem. Há as que criam junto com outras mulheres e, também, o fazem muito bem. São mães. Penso que falar em paternidades envolve, também, dizer de masculinidades e de homens em suas diversidades em nossa sociedade, ainda, muito desigual e marcada, também, pelo machismo.

Imagem editada. Original de StockSnap por Pixabay_ 2021.

QUANDO NASCE UM PAI?

Não tenho a resposta. Creio que não exista um momento único e válido para todas as experiências de paternidades; contudo – observando papais que exercem paternidades ativas – posso dizer: pais nascem quando sentem-se pais.

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